Duas novas cultivares de laranjeira-doce, que aliam maturação antecipada com excelente qualidade do suco, destacando-se pelo sabor marcante e coloração intensa, foram desenvolvidas com base em estudos conduzidos pela Embrapa.
As novas variedades representam um avanço técnico no âmbito da Unidade Mista de Pesquisa e Transferência de Tecnologia (Umiptt) Cinturão Citrícola, localizada em São Paulo.
O lançamento responde à necessidade do setor por mais diversidade varietal, priorizando produtividade e sustentabilidade.
O projeto também contou com o apoio do Fundo de Defesa da Citricultura (Fundecitrus), instituições acadêmicas e produtores rurais, fortalecendo a posição de destaque do Brasil como maior produtor global de laranjas e principal exportador de suco cítrico.
Laranjeira-doce

As variedades Kawatta e Majorca foram trazidas, respectivamente, do Suriname e da Flórida, sendo testadas no estado de São Paulo desde os anos 1990. Ambas se sobressaíram nos experimentos por oferecerem colheita antecipada (entre maio e agosto), suco de excelente padrão, coloração mais viva e bom equilíbrio entre sólidos solúveis e acidez, critério que define o sabor.
Atualmente, as cultivares Hamlin e Valência Americana dominam entre as precoces no Brasil, mas apesar de muito produtivas, entregam suco com cor e sabor inferiores, em especial a Hamlin, a mais amplamente plantada.
Para o pesquisador Eduardo Girardi, da Embrapa Mandioca e Fruticultura (BA), cultivares precoces trazem benefícios significativos. Por amadurecerem mais cedo, enfrentam menos riscos climáticos, como a seca, e viabilizam podas e até a mecanização da colheita, o que pode ser vantajoso no futuro.
“Além disso, as duas variedades apresentam boa produtividade sem irrigação, acima de 30 toneladas por hectare, e já foram avaliadas em várias regiões do estado de São Paulo com os três principais porta-enxertos (parte radicular da planta de citros) usados no estado, mostrando-se compatíveis”, explica Girardi, que atua no polo da Embrapa sediado no Fundecitrus, em Araraquara (SP).
Segundo a pesquisadora Camilla Pacheco, especialista em Melhoramento Genético de Plantas no setor de Pesquisa e Desenvolvimento da Citrosuco, empresa parceira nos testes, o cenário atual para laranjas doces de maturação antecipada ainda apresenta desafios, como a baixa diversidade de cultivares e sucos com menor intensidade sensorial e teor de sólidos solúveis.
“O suco NFC exige matéria-prima de qualidade superior, com maior teor de sólidos solúveis, acidez equilibrada e um perfil sensorial mais rico. Atributos que as cultivares precoces atualmente disponíveis para plantio em larga escala não atendem plenamente. Além dessas limitações, a citricultura enfrenta desafios fitossanitários que impactam diretamente a qualidade da produção. Como, por exemplo, a disseminação do HLB [huanglongbing, também conhecido como greening], que causa alterações fisiológicas nos frutos, reduzindo significativamente a qualidade do suco devido ao aumento da acidez, redução do teor de sólidos solúveis, presença de amargor, além de outras disfunções que corroboram com a ocorrência de sabores indesejáveis”, afirma Pacheco.
Validação das variedades

A Kawatta foi trazida ao Brasil em 1969, enquanto a Majorca chegou no fim dos anos 1980. Ambas foram incorporadas pelo IAC ao Banco Ativo de Germoplasma (BAG) de Citros do CCSM e, posteriormente, encaminhadas ao BAG da Embrapa Mandioca e Fruticultura e à antiga Estação Experimental de Citricultura de Bebedouro (EECB), hoje vinculada à FCC.
De acordo com a pesquisadora Marinês Bastianel, curadora do BAG Citros no CCSM/IAC, as cultivares passaram por microenxertia e limpeza clonal. Desde então, são mantidas em ambiente protegido, como materiais microenxertados e pré-imunizados contra a tristeza dos citros, processo em que as plantas recebem um isolado brando do vírus causador da doença.
As avaliações de campo começaram em 1990, em Bebedouro, com mudas originadas na EECB a partir de borbulhas fornecidas pelo CCSM. Os testes se estenderam por 14 safras, e as cultivares foram comparadas a outras, tendo a Hamlin como referência.
O projeto inicial foi liderado pelo professor aposentado Luiz Carlos Donadio, da Unesp de Jaboticabal (SP), e visava a avaliação agronômica e industrial de clones de laranjeira, em colaboração entre a EECB e a Montecitrus, com financiamento da Fapesp.